segunda-feira, 13 de setembro de 2010

Os psicólogos políticos revelam as emoções por trás das imagens da "mãe" Dilma, do tucano "Zé" e da Marina "zen".

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Imagem da Revista Epoca

A candidata Dilma Rousseff (PT), líder nas pesquisas para presidente, é apresentada em sua propaganda como "mãe do Brasil". A expressão já foi usada diversas vezes pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Há poucos dias, foi citada pela primeira vez pela própria Dilma: "Quero fazer com cuidado de mãe o que ainda precisa ser feito", disse. José Serra (PSDB), o segundo colocado nas pesquisas e principal opositor do governo, usa a imagem de Lula em sua propaganda. Diz como eles trabalharam juntos e segue com um jingle que começa assim: "Quando Lula da Silva sair, é o Zé que eu quero lá".

Os eleitores, evidentemente, sabem que um país não tem mãe. A maioria sabe também que Serra está longe de ser um aliado de Lula. Ao recorrer a esse tipo de marketing eleitoral, os candidatos, porém, não estão mirando apenas a razão dos eleitores. Eles estão em plena disputa de um jogo travado silenciosamente, a cada eleição, pelos comitês de campanha: o da conquista das emoções dos eleitores, na qual o foco são os elementos subjetivos. No processo eleitoral, como em quase todas as decisões na vida, as emoções interagem com a razão e são elas que frequentemente guiam o eleitor na definição do voto.

Que tipo de emoção as campanhas dos candidatos à Presidência querem despertar nos eleitores? Para responder a essa questão, ÉPOCA ouviu especialistas raramente consultados para análises eleitorais: os psicólogos políticos. São profissionais que estudam como a imagem pública dos candidatos é construída junto aos eleitores, mobilizando sentimentos nas entrelinhas. A psicologia política é um ramo de estudos bastante desenvolvido nos Estados Unidos, mas que só agora começa a despertar mais atenção no Brasil. Para esses especialistas, o atual clima de bem-estar reinante no país cria um ambiente favorável a que os candidatos tentem se comparar a figuras familiares para capturar emocionalmente os eleitores. "Estamos vivendo o embalo de um sonho", afirma o psicólogo Jacob Pinheiro Goldberg, que trabalha há 20 anos com o tema do imaginário popular na política. "A disputa se dá entre grupos adversários, mas há um acordo tácito de que tudo vai bem, como nas boas famílias."

Segundo os psicólogos políticos, a associação de Dilma com a figura da mãe foi a solução encontrada pelo marketing de sua campanha para atenuar a rejeição ao perfil de mulher forte, dura e capaz de tomar decisões sozinha, com que ela era caracterizada durante sua passagem pela Casa Civil da Presidência. Essa marca, normalmente associada aos homens, não serve para uma candidata novata em disputas eleitorais. "A imagem de 'gerentona', útil no ministério, é disfuncional na campanha", afirma Joseli Costa, professor de psicologia social da Universidade Federal da Paraíba. "Daí a Dilma mãe, sensível, feminina."
Para conquistar o eleitor, Dilma precisou aproximar-se da imagem convencional das mulheres na sociedade. Por isso, passou por uma transformação visual. Adotou novo corte de cabelo, maquiagem, roupas mais delicadas, começou a sorrir mais. A Dilma vaidosa, feminina, sensível e maternal serve para associá-la a qualidades das mulheres normalmente valorizadas no ambiente doméstico de uma casa. "No senso comum, às mães cumpre educar, exigir.

Quando Dilma age como mãe, ela está cumprindo o papel de mulher", diz Betânia Diniz Gonçalves, professora de psicologia da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais e autora do livro Identidade feminina e a inserção no mundo do poder.
O marketing da campanha de Serra, na análise de Jacob Goldberg, também procura transformá-lo em um personagem familiar próximo do eleitor. Para Goldberg, Serra pode ser comparado a um filho homem, que critica as regras da casa, mas tenta se parecer com o pai. Esse seria o objetivo das propagandas do candidato tucano que tentam aproximá-lo do presidente Lula, como as que enfatizam a origem modesta de sua família. Em um dos programas de Serra na TV, uma cena foi montada para apresentar um "samba na laje" em que personagens pobres cantam seu jingle.

Para Alessandro Soares, professor de políticas públicas da Universidade de São Paulo (USP) e editor da Revista Brasileira de Psicologia Política, a propaganda tenta esmaecer a rejeição que Serra desperta em alguns segmentos da população brasileira por ele ser um político paulista. "São Paulo é o Estado mais rico, que puxa o carro para a frente. Mas também há a ideia da soberba, associada a uma elite econômica", diz Soares. Para Goldberg, ao tentar traçar semelhanças entre Serra e o presidente Lula, que tem origem familiar pobre e usa expressões populares no discurso, a campanha tucana incorre, porém, no erro de desenvolver um mecanismo de defesa que prejudica o candidato por transmitir uma imagem de hesitação. "Serra não deve se fantasiar de pobre ou de Lula. É um risco ficar nessa oscilação hamletiana, esse 'ser ou não ser'", diz ele.

A analogia familiar serve também para caracterizar a estratégia emocional da candidata do PV à Presidência, Marina Silva. Na análise de Goldberg, Marina, por sua trajetória e pela retórica, pode ser comparada à figura da irmã que confronta os desmandos do pai ao sair de casa na adolescência e agora tenta voltar para uma reconciliação. Marina deixou o governo Lula, descontente com sua política ambiental, trocou o PT pelo PV, mas evita partir para o confronto direto e faz uma pregação de conciliação das forças políticas. O discurso de Marina, repleto de referências abstratas a compromissos com a ética, também chama a atenção dos psicólogos políticos. "Quando temos compromissos éticos, a resposta técnica a gente encontra", costuma dizer a candidata do PV. Goldberg identifica nessa postura uma tentativa de parecer madura e acima dos problemas concretos, como uma adolescente da nova geração. "Marina parece estar na plenitude e na idealização. Ela se conformou no papel messiânico", afirma Goldberg. "Seu olhar e carisma dialogam com a alma."

Sigmund Freud, o pai da psicanálise, disse que os fatos da infância costumam determinar o comportamento e as emoções dos seres humanos ao longo da vida. Pela análise dos psicólogos políticos, os candidatos à Presidência comportam-se como mãe, irmão e irmã em busca do lugar de um pai. Se a política brasileira dá a impressão de ter infantilizado o tratamento dado aos eleitores, parece que Freud tem também, para isso, uma explicação.

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